domingo, 26 de setembro de 2010

O Balcão


Jantar sozinho uma febra panada com alface, batata de palito e palha de cenoura crestada, num banco de bar, junto a um rebordo alto de fórmica bordeaux, encostado a um espelho que reflecte o balcão, e o movimento triste doutros tipos solitários, com ar de paquetes, taxistas e pequenos lojistas, e também duma esparsa escória, que devora um ovo cozido ou um rissol de leitão, falando sobre bola, ordinarices ou irrelevâncias, nem sempre é má coisa. Não raro, o olhar deambula, o espírito vagueia e espreguiça-se, num limbo em que fluem as impressões, as recordações, as imagens, levadas por uma corrente de consciência indolor que pode ser tão atraente que certos romancistas, e não os menores, chegam a fazer matéria disso.
Mas a solidão aquietada que compraz a certas almas, das que têm algo para dar a si próprias, nem sempre agrada a outras, que precisam de ser estimuladas de fora, por não fabricarem energia no seu núcleo.

Sem comentários: